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Olhar Pra Frente: Palavras Cozidas

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Sobre discussão para atualização do Código Florestal


Roberto Rocha, 6 de setembro 2009

Palavras não cozinham o arroz, diz um provérbio chinês. Mas podem inviabilizar o seu cultivo, conforme atesta a realidade brasileira. É assim desde que um punhado de bem intencionadas palavras compuseram um conjunto jurídico de portarias, decretos, instruções normativas e resoluções voltadas para coibir o desmatamento, notadamente na Amazônia. O remédio, por excessivo, acabou por asfixiar o paciente.

Ocorre que o decreto 6.514/08, que regulamentou a lei de crimes ambientais, penalizou àqueles que não possuem a averbação da reserva legal de suas terras. De uma só tacada milhões de produtores foram postos na ilegalidade, com prazo exíguo e irreal para enfrentar a selva burocrática do país, essa sim, imune ao desmatamento.

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Pelas novas normas algumas culturas tradicionais como o arroz das várzeas, ou as vinícolas das encostas de morros foram postas à margem da lei e sujeitas aos rigores administrativos desde a falta de crédito bancário até a sanção da multa.

Como enfrentar questão de tal modo espinhosa, sem abrir mão da necessidade de proteger e da urgência de produzir? Onde formular os consensos capazes de arbitrar uma solução para o problema? Como presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara percebi que a arena política estava travada por posições que se traduzem na prática como uma verdadeira guerra santa. Busquei então inovar em matéria legislativa, procurando formular primeiro um consenso técnico em torno do assunto.

Desse modo constitui um Grupo de Trabalho voltado para a atualização do Código Florestal, formado por técnicos dos ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura, indicados pelos ministros das pastas, consultores legislativos das duas áreas e assessores técnicos do autor do PL 6424, senador Flexa Ribeiro, e do relator, deputado Jorge Khoury.

Defini como nossa missão identificar os pontos de consenso, sobre os quais é possível fazer avançar a legislação, aguardando que no futuro possamos enfrentar aquelas questões para as quais não há ponto de equilíbrio possível.

Dentre os assuntos que merecem a atenção do Grupo estão a definição do conceito de reserva legal, os prazos para a recomposição de áreas degradadas, a regularização dos passivos ambientais, a adequação dos processos administrativos e penais à nova legislação. Em suma, a tarefa de reduzir os conflitos entre a legitimidade e a legalidade dos usos do solo.

Nas próximas semanas disporemos de um documento para tentar destrinchar esse nó que ameaça milhões de produtores em todo o país. Aí, entrarão em cena os políticos, a partir de uma base consensualizada que possa compatibilizar a letra e o espírito da lei para que esse impasse não agrave ainda mais a já difícil situação dos nossos agricultores.

Nota do editor da Aldeia: Direto da Aldeia Global publica duas vezes por semana, capítulos de Olhar pra Frente, uma visão de futuro, livro de Roberto Rocha, 2014, 254pp, Ed. 360º, organizado por Manoel dos Santos Neto com ilustrações de Monroe Júnior e prefaciado por Hilda Bogéa e Lourival Bogéa, com os artigos do autor publicados, originalmente, no Jornal Pequeno.
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