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Saúde: Audiência pública se transforma em bagunça

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O Secretário Municipal de Saúde de Imperatriz, Alair Batista Firmiano, compareceu à audiência pública realizada pela Câmara Municipal de Imperatriz em 2 de maio de 2019, para apresentar relatório de receitas e despesas do terceiro quadrimestre de 2018, ato absolutamente normal no âmbito da administração pública. Ressalta-se que, como todos sabem, a Câmara é composta por 21 vereadores, dos quais, pelo menos 15, constituem uma base de apoio ao Executivo, de forma que esse Poder dificilmente sofreria uma derrota no Plenário da Câmara.

Mesmo assim, repetindo uma estratégia já utilizada por ele outras vezes, o secretário compareceu à audiência, cercado por servidores da saúde, principalmente daqueles que ocupam cargos comissionados. Esses servidores ocuparam as galerias, e todas as vezes que um dos vereadores de oposição ao prefeito se manifestaram, foram ruidosamente vaiados e desacatos pelos servidores da saúde presentes. Ao mesmo tempo, todas as vezes que o secretário se manifestou, muitas vezes de forma irônica e desrespeitosa em relação ao Poder Legislativo, foi ensurdecedoramente aplaudido, fenômeno repetido cada vez que um dos vereadores pertencentes à bancada da situação se manifestou.

Tudo isso poderia ser considerado normal, se os servidores da Secretaria Municipal de Saúde estivessem presentes à audiência pública como cidadãos conscientes que, em um sistema político democrático, têm o sagrado direito de se manifestar diante de tema tão importante, como são aqueles relacionados à saúde pública, a qual, nos termos do Caput do Art. 6º da Constituição de 1988 estabelece que “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (EC no 26/2000, EC no 64/2010 e EC no 90/2015)” (Grifo nosso).

Ocorre que ao comparecer à audiência para simples apresentação de relatório de receita e despesa de um período administrativo determinado, acompanhado de uma claque formada por servidores públicos, possivelmente convocados pelo próprio secretário, numa tentativa de desmoralizar vereadores, legítimos representantes do povo no Parlamento, cometeu alguns deslizes: i) demonstrou medo da pequena bancada de oposição; ii) desrespeitou o Parlamento, portanto, os cidadãos de Imperatriz.

Ao demonstrar medo, o secretário pode estar tentando esconder alguma coisa, inclusive, má gestão da saúde pública. Ao desrespeitar o Parlamento, desrespeitou um dos princípios mais elementares da democracia, o direito dos parlamentares se manifestarem livremente sobre todo e qualquer assunto de interesse público, que neste caso, é a apreciação de relatório de receitas e despesas da saúde relativo ao 4º bimestre de 2018, transformando a audiência pública em um show de baixarias e de desrespeito à democracia corporificado na cassação tácita das manifestações de alguns parlamentares no cumprimento de seu dever e de suas prerrogativas.
Mas não é só isso. Ao convocar servidores públicos da pasta que administra para lhe aplaudir e para apupar vereadores, pode ter cometido crime de abuso de autoridade previsto na Lei Nº 4.898/65. O crime fica tipificado no momento em que o gestor público, neste caso, o secretário de saúde, que utilizando-se do poder representado pela função que ocupa, convoca servidores públicos para atividades alheias às suas funções. Neste caso, os servidores podem ter atendido a uma ordem ou solicitação do secretário, em face de ameaça, mesmo que velada, que poderia resultar em prejuízos para o salário ou para a carreira desses servidores. Pontua-se que constitui crime de autoridade, nos termos do Art. 3º da Lei Nº 4.898/65, dentre outros, o atentado:

a) à liberdade de locomoção;
[…]
d) à liberdade de consciência e de crença;
[…]
j) aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional.


Se houve convocação dos servidores da saúde pelo secretário para comparecerem à audiência pública realizada pela Câmara Municipal, o secretário atentou contra a liberdade de locomoção estabelecida pela alínea “a” do Art. 3º da Lei Nº 4.898/65, uma vez que teriam sido obrigados a permanecerem por várias horas em determinado local contra sua livre vontade; de igual forma, atentou contra a liberdade de consciência e de crença prevista na alínea “d” do Art. 3º do mesmo diploma legal; e, finalmente, atentou contra os direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional estabelecido pela alínea “j” do mesmo Art. 3º da Lei Nº 4.898/65. Neste caso, o secretário poderia ser responsabilizado pelo crime de abuso de autoridade.

Resta esclarecer que há objetividade jurídica do crime de abuso de autoridade, quando, no exercício de sua função pública, a autoridade deixa de zelar por aquilo que a norma jurídica quer proteger:

a) Proteção mediata. A dignidade da função pública e a lisura do exercício da autoridade pelo Estado, ou seja, o funcionamento da administração pública, a partir do exercício regular de seus poderes delegados pelo povo;
b) Proteção imediata. Os direitos e garantias fundamentais constitucionalmente consagrados (honra, liberdade, patrimônio).


Diante disso, se faz necessário um posicionamento do Poder Legislativo em relação ao assunto. Penso que a audiência pública em questão, não cumpriu seu objetivo, inclusive porque o secretário não apresentou previamente o relatório e os documentos conexos para análise prévia dos vereadores. Além disso, valeria a pena uma consulta à Procuradoria da Câmara Municipal visando a possibilidade de se representar contra a atitude infantil e descabida do secretário no âmbito judicial.

Ribamar Silva
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