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Debate: O papel da psicologia na orientação sexual

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por Frederico Luiz

O assunto é a orientação sexual e o Blog Terra Magazine coordenado por Bob Fernandes coloca mais lenha na fogueira. Há quem prefira o contrário, o debate apenas coloca água na fervura.

Abaixo, com a intermediação de Ana Cláudia Barros, duas reportagens sobre orientação sexual e os marcos legais e psicológicos. O deputado federal tucano que coordena a Frente Evangélica e a palavra oficial do Conselho Federal de Psicologia.

Boa Leitura

Gays têm direito à terapia para mudar
orientação sexual, diz deputado

por Ana Cláudia Barros

Autor do Projeto de Decreto Legislativo que propõe tornar sem efeito a resolução que estabelece normas de atuação dos psicólogos em relação à orientação sexual dos pacientes, o deputado João Campos (PSDB-GO) nega que a iniciativa tenha a intenção de abrir caminho para a legalização da cura de homossexuais. De acordo com o presidente da Frente Parlamentar Evangélica (FPE), o projeto pretende discutir a "injuridicidade da resolução do Conselho Federal de Psicologia".

A resolução em questão determina que os profissionais de psicologia não podem exercer "qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas", nem adotar "ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados". Veta ainda qualquer manifestação pública de psicólogos no sentido de "reforçar preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica".

Tucano João Campos quer apoio de psicólogos para 'reverter gays'
- Não estou discutindo se homossexualismo é doença, comportamental ou genético. No meu projeto, discuto a injuridicidade da resolução do CFP. Acho que a matéria que está posta na resolução é objeto de lei. Sendo objeto de lei, o Conselho Federal de Psicologia não poderia ter editado. Resolução é para regulamentar algo que já consta numa determinada lei. Então, o Conselho Federal de Psicologia editou resolução que não regulamenta lei nenhuma. O conselho usurpa a competência do Parlamento, coisa que está virando rotina no Brasil - declara Campos.

Apesar do discurso cuidadoso, o deputado admite que defende terapia para homossexuais que queiram reorientar sua sexualidade.

- Embora não esteja discutindo isso, eu entendo que é uma questão comportamental, e o homossexual, maior de 18 anos, que queira buscar esse auxílio de reorientação (sexual) deve ter esse direito. Nada imposto, nada obrigado.

O parlamentar reconhece, entretanto, não se tratar de uma doença.

- O que a ciência continua investigando é se o homossexualismo é genético ou se é comportamental. Nestas duas vertentes, nenhuma delas é doença, portanto, não comporta cura. A ciência não tem uma conclusão. Agora, se a própria ciência não tem uma conclusão, por que determinado homossexual, lúcido, que entende que é uma questão comportamental e que o homossexualismo não é uma patologia, e quer passar pelo procedimento de uma terapia de reorientação, por qual razão não encontra (auxílio)? - indaga.

Sobre o argumento do presidente do CFP, Humberto Verona, de que o projeto seria uma interferência na legislação do País, que criou conselhos responsáveis por delegar aos próprios profissionais a tarefa de fazer a regulação de suas profissões, Campos rebate:

- Os limites de regulamentação de profissões têm que estar dentro das normas gerais do direito, inclusive, respeitando a autonomia das pessoas em razão da responsabilidade civil delas. Em harmonia com os princípios da Constituição Federal, o novo Código Civil estabelece que as pessoas adquirem a responsabilidade plena a partir dos 18 anos. Aí, vem a resolução do Conselho Federal de Psicologia e diz, em outros termos, mas é como se fosse isso, que embora a pessoa seja maior de 18 anos, não tenha problemas mentais, esteja apta a responder por todos os seus atos, ela, no caso de ser homossexual e de entender que o homossexualismo é fruto de um comportamento... Ela deseja ter orientação de um profissional da área de psicologia, mas não pode ter. Onde isso se sustenta no direito brasileiro? - reitera o questionamento.

O Projeto de Decreto Legislativo de Campos está sendo avaliado pela Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara e, em seguida, passará pelo crivo da Comissão de Constituição e Justiça. Conforme o deputado, serão realizadas, ainda neste semestre, audiências públicas "para que o debate seja ampliado".

- O projeto propõe tornar sem efeito a resolução (do CFP) para que o Parlamento possa editar uma lei. Esta lei pode trazer o mesmo teor da resolução ou um teor diferente. É o Parlamento que vai votar - resume.

Psicólogo não muda orientação sexual,
rebate presidente de Conselho Federal

por Ana Cláudia Barros

O presidente do Conselho Federal de Psicologia (CFP), Humberto Verona, considerou "muito preocupante" a movimentação da Frente Parlamentar Evangélica (FPE) para tornar sem efeito a resolução da categoria que "estabelece normas de atuação dos psicólogos em relação à questão da orientação sexual". Um Projeto de Decreto Legislativo com esta finalidade foi apresentado pelo deputado federal João Campos (PSDB-GO), que preside, no Congresso, a FPE, atualmente composta por 76 parlamentares, três deles, senadores.

A Resolução 001/99 do CFP determina que os profissionais da área não podem exercer "qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas", nem adotar "ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados". Veta ainda qualquer manifestação pública de psicólogos no sentido de "reforçar preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica".

- Nossa resolução é muito cara aos psicólogos, não só brasileiros, mas os de todo o mundo. Somos chamados em vários países para falar dessa experiência que temos no Brasil. Ela tem sido um exemplo. Vamos fazer todo esclarecimento público possível. A intenção dos deputados que estão cuidando disso é outra. Ela tem uma origem moral, nos seus conceitos religiosos. Não há uma preocupação real com a sociedade. Se houvesse, esses deputados estariam defendendo a resolução, o direito de as pessoas terem sua orientação sexual exercida com liberdade e respeito. Vamos tentar sensibilizar a opinião pública para que isso não avance - afirma Verona.

Na avaliação do presidente do CFP, a bancada evangélica além de interferir diretamente no exercício da profissão, pode abrir precedentes, ferindo à laicidade do Estado.

- Achamos que uma lei que possibilite, por concepções religiosas, que profissionais tratem de orientação considerada "inadequada" é um problema grave para a sociedade brasileira. Não podemos deixar isso passar. O projeto é um retrocesso e é uma interferência na própria legislação do País, que organizou o exercício das profissões. No Brasil, temos leis que criam conselhos e que delegam aos próprios profissionais fazer a regulação da sua profissão de acordo com as necessidades e demandas da sociedade. Queremos continuar a ter garantias do nosso direito de fazer isso.

Verona lembra que a concepção de naturalidade da orientação heteroafetiva é contestada pela psicologia.

- Toda essa pressão está muito dirigida à orientação homoafetiva, porque há aqueles que acreditam na naturalidade da orietação heteroafetiva, como sendo a orientação natural da espécie humana. A psicologia e outras ciências já compreenderam que não é assim. A heterossexualidade não tem nenhuma natureza especial, diferente da orientação homoafetiva. Ambas as orientações fazem parte da dimensão subjetiva, da experiência da sexualidade humana. Então, para nós, não existe uma orientação que é a natural e a normal e uma desviante, que precisa ser tratada. Há um equívoco de base na compreensão da própria questão da sexualidade. Sabemos que o equívoco não é por ignorância, mas acontece por uma questão de filiação a fundamentos religiosos, que pregam isso.

O presidente do CFP explica como deve ser a abordagem do profissional quando procurado por um paciente em conflito devido à orientação sexual:

- Por termos outra concepção, nosso código de ética nos impede de oferecer cura. Nem o heterossexual que quer virar homossexual nem o homossexual que quer virar hétero. Temos que investigar qual sofrimento está sendo produzido naquele sujeito a partir da sua orientação sexual. Nosso papel é cuidar do sofrimento. Temos que acolher o sujeito e ajudá-lo a entender porque sofre. O sofrimento não é pela prática de uma orientação sexual, mas pelo conflito que isso gera em função da expectativa que a pessoa tem em relação ao grupo social no qual convive. É nosso papel ter essa compreensão.

Humberto Verona esclarece que a prática do psicólogo não pode sofrer interferência de crenças religiosas.

- A fé de cada um não pode ser exercida numa prática comum no conjunto de uma categoria profissional. Todos têm o direito de ter sua fé individualmente, mas no momento do exercício profissional, dispomos de métodos, técnicas, teorias que são validadas socialmente, por órgãos de regulação, por instâncias de pesquisas. Não dá para misturar o exercício da profissão com a profissão de fé de cada um.

Fonte: Terra Magazine
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