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De Açailândia para as telinhas do Brasil

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Amanhã, no Faustão, tem mais Marcelo Grangeiro
FONTE: Sítio Praça da Cultura
por Maria Lilia Diniz

Acompanhei o trabalho de Marcelo, quando estivemos vinculados ao Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos de Açailândia, seu esforço, profissionalismo e acima de tudo seu jeito moleque de ser. O moleque que fez da dança seu objetivo de vida e cresceu dançando, dançou crescendo em bom caráter, humildade e determinação.

Estive no Rio de Janeiro e não pude resistir à tentação de dizer-lhe pessoalmente o que já vinha dizendo via messenger. Elogiar seu desempenho, falar da alegria e da mobilização que a cidade vive em função do seu trabalho, e o mais importante, a referência de superação que ele representa na cidade pequena de Açailândia.
O resultado foi uma entrevista, com a qual brindo vocês que estarão torcendo por ele na grande final da Dança dos Famosos. Viva Marcelo Grangeiro. Viva Açailândia. Via a dança. Viva a cultura brasileira.



Como foi seu encontro com a dança?
Desde criança sempre gostei de dançar. Na década de 90 eu gostava de dançar lambada com a minha irmã, mas dançávamos do nosso jeito (risos). Ao lado da minha casa tinha uma academia de ginástica e um dia, vendo uma aula de dança country, resolvi arriscar a dança. Não acertei nenhum passo, mas nenhum mesmo. Enquanto todos iam para um lado, e eu ia para o outro, e fiquei muito frustrado. Decidir que dançar não era a minha praia.


Algum tempo depois, mesmo desanimado, eu sentia que continuava sendo chamado pra dança. Nessa mesma academia, teve outro professor de dança e ele tinha um grupo de STREET DANCE (dança de rua). Certo dia faltou uma pessoa que faria o papel da morte na coreografia. O que fazia a morte? Nada. Ficava na frente segurando uma foice, era a “pedra da peça da escola” (risos). Mas eu queria tanto dançar que me ofereci pra fazer a morte. Em uma das apresentações o professor perguntou se eu queria dançar um pouco. Eu sabia fazer apenas um passo, mas fiz com tanto gosto que parecia que eu sabia(risos). 


A partir daquele dia eu senti algo diferente nascendo em mim, nascia um desejo em relação à dança e comecei a dançar. Comecei direto, experimentando por conta, como autodidata. Como em nossa região era difícil esse tipo de profissional para ensinar dança, eu, que aprendia por conta comecei a ensinar outros que queriam aprender o pouco que eu sabia. Foi um grande desafio pra mim, mas ali foi o início da minha carreira.

O que mudou na tua vida com esse encontro?
Nesse mesmo momento da minha vida eu estava passando por uma transição, de adolescente rebelde a adulto perdido, e cheguei a me envolver com drogas, a dança veio como uma válvula de escape. Através dela eu consegui me afastar, e minha mãe, em especial me deu muita força. Sempre falo que Deus me colocou naquela situação para que depois eu pudesse ajudar outras pessoas, e através da dança isso acabou acontecendo. 

A Dança te encontrou ou você a buscou?
Com certeza eu a busquei, porque não tinha talento, tinha dificuldade de aprender e não tinha quem me ensinasse. Por falta de tudo isso e motivado pelo meu desejo de aprender, tive que estudar mais, procurar mais, descobrir mais, pesquisar mais, enfim, tive que buscar mais que as muitas pessoas que tinham fácil acesso a esse conhecimento.

Como era a tua vida de artista em Açailândia?
Muito corrida, difícil, mais muito bem vivida. Sempre falo que estava em lugar geograficamente desprivilegiado, morando no nordeste, interior do maranhão, em Acailândia, que apesar de ser a segunda maior economia do estado, não tem uma cultura de dança e nem cultura artística bem definida. Tive que desbravar terrenos, criar situações para poder trabalhar, e trabalhar com vários estilos de dança para poder sobreviver e trabalhar em muitos lugares ao mesmo tempo, tendo que dividir meu tempo em dar aulas, ensaiar e fazer faculdade. Tempos bons que aprendi muito. 


Em relação a apoio, quero acreditar que a minha cidade a partir de agora, com a repercussão nacional do meu trabalho, possa ter outra visão para com os artistas, e espero que os meus amigos guerreiros, que ficaram lá tenham mais apoio por parte do poder público e da iniciativa privado. Falo disso porque eu não tive muito apoio, que batalhei e por isso mereci o que conquistei, e quando não o tive, procurei me fortalecer, nunca deixei de fazer por falta de apoio, sempre dei meu jeitinho.

No Brasil existe preconceito contra o homem que dança?
Eu sofri muito preconceito no início da minha carreira e até hoje sofro. Menos, mas sofro. Quando eu disse ao meu pai que eu estava trabalhando com dança ele me disse: - Agora lascou! Você tá inventando esse negocio de dançar que é para não trabalhar, e mais, nunca imaginei que teríamos um GAY em nossa família. Meu pai é um homem simples, paraibano e fruto de uma sociedade homofóbica, e pra ele seria difícil aceitar a homossexualidade na família. Pra mim isso não tem problema. Tenho grandes amigos gays e respeito a opção deles, não tenho nenhum preconceito desse tipo.

Quais os maiores desafios que você enfrentou em Açailândia?
Dentre as várias dificuldades, acredito que a dificuldade financeira foi uma das maiores, porque além de não ter dinheiro para produzir os trabalhos, tinha que trabalhar com vários ritmos de dança para me manter, porque nunca deu para viver em Açailândia somente com a dança de salão. Mas ao mesmo tempo, em que reconheço as dificuldades, acredito que isso foi muito bom pra mim, porque tive que aprender a me adaptar a diversas situações e mesmo assim, isso nunca me fez desistir de trabalho algum.

E agora no Rio de Janeiro, esta cidade que respira arte, quais os desafios?
Na verdade estou morando em São Paulo e ficarei no Rio até terminar a “dança dos famosos”. O grande desafio que pensei inicialmente seria o de me adaptar, e isso graças a Deus não foi muito difícil. Foi mais rápido do que eu imaginei. 


Tenho que me adaptar às formas de fazer arte aqui, que são bem diferentes das de Açailândia. Estou em um lugar que tem grandes profissionais, tenho que continuar estudando para que um dia eu possa ser em desses grandes nomes da dança no Brasil, e por que não sonhar, do mundo.

Qual o seu maior desejo hoje?
Ganhar a “dança dos famosos”. Mais na verdade sou uma pessoa de muitos desejos, além desse, um outro, e talvez o principal, é que a cidade de Açailândia possa dar mais valor aos seus artistas, para que possam desenvolver melhor seus trabalhos e que eles não precisem sofrer como eu sofri para ser reconhecido e prestigiado. 

E essa história da “dança dos famosos”, como foi que aconteceu? Como você recebeu o convite? Como está sendo esta experiência?
Três amigos meus: Luis Florião (presidente da ANDANCAS Associação Nacional de Dança de Salão), Gracinha (Coordenadora do Curso de pós-graduação em Dança de Salão) e Selma (professora de dança de salão em São Paulo), me perguntaram se eles poderiam me indicar para fazer um teste para participar da dança dos famosos, e eu disse que sim. Depois de algum tempo recebi um email do Diretor coreográfico do programa, Sílvio Lemgrumber, me pedindo algumas informações sobre o meu trabalho além do curriculum enviado, e em seguida perguntou se eu poderia ir ao Rio de Janeiro participar de um teste prático com mais outros onze professores que foram selecionados. Passadas três semanas depois recebi a confirmação que eu seria um dos professores da “dança dos famosos” 2010. 


Estou aprendendo muito com tudo que está acontecendo. O Sílvio me ensinou muita coisa e serei eternamente grato pelo carinho e respeito que ele e sua esposa Bubu (carinhosamente chamada assim pelos amigos) com que eles me trataram além de toda a equipe do dança. 

Quais os planos futuros?
Boa pergunta. Estou deixando as coisas acontecerem, até entao estou totalmente focado na “dança dos famosos”. Meu projeto, por enquanto, é continuar dando aulas em São Paulo e pelo Brasil. Depois quero montar um trabalho novo de apresentação no segundo semestre deste ano.

E Açailândia, que lugar ocupa em tua vida hoje?
O lado esquerdo do peito. Amo minha cidade e só não estou lá porque preciso de novos desafios na vida. No momento não penso voltar a morar lá, estarei indo a passeio. Pretendo voltar futuramente e viver o resto da minha vida por lá. Lá tenho minha família, amigos e minha história, e jamais esquecerei o que vivi e aprendi, mesmo com todas as dificuldades.

O que você diz aos teus alunos e alunas que ficaram em Açailândia, e que tem em você uma boa referência?
Que se eles querem a dança como profissão ou se querem apenas continuar dançando, que não percam as esperanças porque tenho certeza que eles alcançarão seus objetivos, se continuarem a lutar, buscar, estudar, fazer, preservar e inovar seus trabalhos e acima de tudo nunca esquecerem sua origens, se fizerem isso com muita humildade com certeza, pode demorar, mais um dia alcançarão seus objetivos.

Nota do blogueiro: Entrevista enviada em primeira mão ao Folhão de Açailândia.
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