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Grávida morre sem atendimento em Belém

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Vanessa Elaine Xavier da Cruz, 26 anos, grávida de cinco meses, morreu sem ser atendida no Hospital de Pronto-Socorro Humberto Maradei Pereira, no bairro do Guamá, em Belém-PA. O fato foi relatado pelos policiais militares que a conduziram até o hospital depois de inúmeros pedidos de socorro ao Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), na madrugada de ontem.

Depois da recusa, a mulher chegou a ser atendida na Santa Casa de Misericórdia do Pará, onde, segundo nota divulgada pela instituição, chegou com morte aparente. Várias tentativas de reanimação foram feitas pelo corpo técnico que a atendeu, mas nada mais podia ser feito.

O caso foi registrado na Central de Flagrantes da Seccional de São Brás, pelo companheiro de Vanessa, Marco Antônio Silva. Ele contou que no início da madrugada a mulher começou a sentir fortes dores. Desesperado, só procurou ajuda na Seccional da Cremação, que fica próximo a casa onde moravam, depois de não ter conseguido ambulância do Samu 192.

Segundo a Polícia Civil, Vanessa foi conduzia por viaturas da PM até o PSM, mas não foi atendida. Após serem informados que no local não havia obstetra, por não realizar este tipo de atendimento, os policiais forçaram a entrada no estabelecimento, sem sucesso. Apresentando sangramento e convulsões, a mulher foi encaminhada dentro da mesma viatura à Santa Casa. Após a confirmação da morte, o corpo foi encaminhado ao Centro de Perícias Científicas “Renato Chaves”.

Segundo depoimento à Polícia Civil, Marco Antônio garantiu que ele e os policiais militares permaneceram na porta do PSM por alguns minutos enquanto insistiam no atendimento. À equipe de reportagem da RBA, que esteve no local ainda na madrugada, o policial Bernardo, responsável por conduzir Vanessa até o hospital, contou que um funcionário do PSM chegou a conduzir a maca para realizar o atendimento, mas ao ouvir que se tratava de uma gestante recuou.

A polícia disse que o transporte da paciente para a Santa Casa teve que ser realizado na viatura, mesmo com uma ambulância estacionada na frente do pronto-socorro. A Secretaria Municipal de Saúde (Sesma) informou, através de nota que não consta registro de solicitação de atendimento na Central do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu 192) para Vanessa e que o atendimento da paciente no PSM só não foi realizado porque os policiais retiraram a jovem do hospital antes que fosse atendida pelas médicas plantonistas que se dirigiram para a viatura. Segundo a nota, os portões do hospital foram abertos para que ela fosse atendida.

Esclarecimentos
Um membro da Guarda Municipal do PSM do Guamá disse que por volta das 2h30, uma viatura da 4ª ZPol regressou ao local e levou, sob custódia, a porteira, a técnica de enfermagem e a médica que estavam de plantão para prestarem esclarecimentos. O grupo foi encaminhado para a Central de Flagrantes. O caso está sendo apurado pela Divisão de Investigações e Operações Especiais (Dioe).

Em entrevista ao Diário na noite de ontem, o ministro da Saúde Alexandre Padilha lamentou a morte de Vanessa. “Acabei de saber desse fato lamentável (por volta das 19h) e estou indignado. Essas mortes vão de encontro a toda e qualquer diretriz de saúde pública nesse país”.

Para Padilha, as investigações do ocorrido devem ir a fundo e os responsáveis punidos. “O profissional de saúde jamais pode deixar de atender um paciente em risco de vida, muito menos uma mulher grávida. O governo do Pará tomou a medida correta recentemente ao intervir na Santa Casa e afastar o corpo diretor e os responsáveis pelo não atendimento àqueles gêmeos que faleceram. A mesma atitude se espera do município agora”. (Com informações de Leonardo Fernandes).

Esperava ansiosa pelo nascimento
Vanessa trabalhava com crianças e amava o que fazia. Educadora infantil em uma escola de Belém, ela esperava ansiosa pelo nascimento da primeira filha. De acordo com amigas da moça que estiveram no Instituto Médico Legal (IML), na tarde de ontem, Vanessa fazia planos para o futuro. “Ela ia fazer até um chá de bebê no próximo mês, para reunir os amigos e garantir que nada faltasse à filha”, contou uma amiga, que preferiu não se identificar.

Segundo Gracirene Saito, diretora da escola onde Vanessa trabalhava, ela era muito querida. “A notícia da morte dela foi um choque para todos. Na manhã de ontem ela trabalhou normalmente. Acompanhávamos a gravidez dela e sabíamos que tudo estava indo bem. O acompanhamento pré-natal estava em dia e ela não apresentava sinais de nenhuma doença. Se for confirmada a omissão de socorro vamos ajudar a família a esclarecer tudo que aconteceu e garantir que a morte dela não tenha sido em vão e os culpados sejam punidos”.

A família da vítima esteve no IML, mas o companheiro de Vanessa não quis falar com a imprensa. A mãe dela, Maria Augusta Rocha da Cruz, mesmo relutante desabafou: “Quero justiça. Tenho certeza que se minha filha tivesse sido atendida a tempo eu não estaria aqui esperando a liberação do corpo dela. É uma dor imensa. Vamos levar o caso adiante para que seja apurado o que realmente aconteceu”.

Há alguns anos Vanessa morava sozinha, mantinha pouco contato com a família, que não conhecia Marco Antônio. “Ficamos sabendo da gravidez dela apenas algumas semanas atrás”, disse a irmã da jovem, que não quis se identificar. Segundo ela, uma briga afastou Vanessa do convívio familiar. “Não nos dávamos muito bem, agora nessa situação vejo como ela era importante para todos”, lamentou.

Velório
O velório de Vanessa ocorreu na Igreja de São Judas Tadeu, na avenida Alcindo Cacela, mas a imprensa foi impedida pelos familiares de acompanhar. O laudo pericial que vai apontar as causas da morte deve sair em 15 dias. Vanessa será enterrada com o feto ainda na barriga.

Fonte: Diário do Pará
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