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Mulheres são revitimizadas por imprudência, negligência ou imperícia

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Em comemoração aos 10 Anos da Lei Maria da Penha, que acontecerá no dia 07 de agosto de 2016, o Centro de Promoção da Cidadania e Defesa dos Direitos Humanos Pe. Josimo, entidade que compõe, o Fórum de Mulheres de Imperatriz, a Articulação de Mulheres Brasileiras e a Rede Nacional Feminista de Saúde Sexual e Reprodutiva, apresentará nos próximos cinco meses 10 textos que analisa práticas do judiciário, estudos de casos e artigos publicados em 2015 e 2016, em revistas e livros científicos. (Conceição Amorim, Centro Padre Josimo)

Texto 01

Mulheres são revitimizadas por imprudência, negligência ou imperícia


O papel em forma de sentença, infelizmente ainda aceita tudo. Neles juízes deveriam fazer uso da Lei em prol da Justiça. Alguns destes papeis abrandam o que não deveriam esconder ou evidenciam o inexistente, lamentavelmente e para o desespero de em média, 462 brasileiras por mês, que são mortas e mais outras centenas torturadas psicologicamente com seus agressores seguindo 'impunes'.

No caso de maranhenses violentadas parece que as Instituições do Sistema de Justiça e seus papeis impressos, subscritos e publicados podem estar tão distantes de nossa realidade que ao invés de fazer ecoar a Justiça só conseguem traduzir angústia. E muita indignação.

O problema de colocar o que não se deveria no papel e ou de omitir o que está absolutamente explícito nas provas de um processo pode ser a força motriz que colabora para desestabilizar o lado que acredita ou precisa acreditar, 'ainda', nas Instituições do Sistema de Justiça. Esta atuação de alguns magistrados afasta e retarda a busca por justiça, necessária e urgente para tantas mulheres! Esta prática certamente é uma das explicações fundantes para o aumento de quase 90% de feminicídio de mulheres maranhenses entre os anos 2006 e 2013.

Não deveriam ser todos os magistrados que julgam violência contra a mulher tecnicamente aptos a colocarem no papel aquilo que representa o real direito, expressando dominar a Lei Maria da Penha e todas as tratativas internacionais que a embasam? Não deveriam os juízes de família dominar e embasar suas decisões segundo o ECA, que já tem 26 anos?

Tomemos como ponto de reflexão um caso recente versando sobre violência doméstica contra mãe e filha, em acompanhamento por dezenas de movimentos feministas. Em apreciação de uma denúncia ministerial de ameaça de morte, na Vara Especializada da Mulher e da Violência Doméstica o juiz de primeira instancia, substituindo o titular da vara, após receber a denúncia, absolveu sumariamente o réu, admitindo que a ameaça de fato ocorreu, mas que foi proferida no “calor de uma discussão, logo, não foi séria, idônea, fria e planejada, capaz de causar medo à mulher, vítima de violência de gênero.”

Pergunta-se: que feminicídio, lesão corporal ou qualquer outro tipo de violência contra mulheres, por questões de gênero, acontecem de modo frio e ou planejado?

O magistrado, respondendo pela vara especializada em 2015, demonstrou total desconhecimento em relação à especificidade da violência de gênero, e pior ainda, na prática, julgou à luz da Lei 9099/95, avaliando uma ameaça de morte contra uma mulher, ocorrida, como a maioria, na frente da filha menor da vítima, como uma bagatela doméstica, uma discussão entre marido e mulher, perante a qual, ele decididamente optou, à revelia da Lei, não meter a colher.

Quantas decisões estão sendo proferidas no MA à revelia da Lei Maria da Penha, que em agosto completa 10 anos?

Quantas vidas foram ceifadas e ainda serão antes que se entenda que a Lei precisa ser devidamente aplicada para que seja efetivada?

Um obstáculo absolutamente danoso se impõe à proteção de inúmeras mulheres maranhenses: a violência institucional aos direitos humanos, fazendo reverberar a violência para além daquelas vividas em um ambiente doméstico, infelizmente, repercutindo na estrutura de um sistema de justiça que deveria proteger.

Quantas outras mulheres maranhenses estão hoje na situação de julgamentos imperitos, que ignoram ou minimizam a gravidade da violência psicológica, a segunda mais denunciada em todo Brasil, e que sempre antecedem os feminicídios?

Mesmo com dez anos da Lei Maria da Penha ainda vamos aceitar que o judiciário só aja diante do tiro ou da facada enquanto o país assumiu o compromisso de 'punir todas as formas de violência contra as mulheres'?

Para agravar a situação relatada a quinta vara de família vem proferindo decisões conflitantes com a vara especializada, ignorando os seis processos que lá tramitam e um inquérito por lesão corporal em curso na Deam. Além disso, em plantão judicial, o desembargador, cuja tia é avó do advogado que acompanhou o agressor nas últimas audiências ocorridas na vara da mulher, sem ter tido qualquer acesso aos autos, ignorando a existência dos seis processos contra o mesmo agressor na vara especializada e o inquérito por lesão corporal em curso, decidiu jogar a Lei Maria da Penha no lixo, colocando no papel o que achou conveniente, desconsiderando a violência psicológica denunciada e em pleno curso de apuração na vara especializada, concedendo liminar em sentido contrário ao desembargador prevento, demonstrando que a justiça pode por vezes ser imprudente ou afeta a parentes.

Qualquer parentesco entre o magistrado, partes e advogados deveria, moralmente, ensejar a suspeição de qualquer desembargador para atuar em um mandado de segurança, especialmente em plantão e sem acesso aos autos ou não?

Considerar qualquer litígio que envolva violência doméstica e ou intrafamiliar como “lamentável ou perfeitamente evitável”, como fez o desembargador plantonista no caso concreto que exploramos, evidencia que por conveniência pode-se desconsiderar a gravidade do que a ONU reconhece ser a maior pandemia do século XXI.

A reafirmação social na credibilidade do papel justo parece ser uma das portas de saída para que se deixe inclusive de apelar para justiçamentos amorais e se volte a acreditar que a Justiça pode prosperar, reacendendo a possibilidade de, pelo papel, chegar-se a desfechos 'justos' de violações de direitos humanos de mulheres no 'Maranhão'.

Conceição Amorim
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