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FeliS: Pedro Tierra revisita as trevas da ditadura

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Carolina Nahuz

São Luís, MA. O poeta Pedro Tierra remexeu os baús do período da ditadura instalada no país a partir de 1964 durante a palestra “Memória da Ditadura”, realizada na 8ª Feira do Livro de São Luís, na noite desta terça-feira (4), na sede da Fundação da Memória Republicana Brasileira (FMRB), no Convento das Mercês. A 8ª FeliS é promovida pela Prefeitura de São Luís, através da Fundação Municipal de Cultura (Func) e da Secretaria Municipal de Educação (Semed).

FeliS
Palestra de Pedro Terra (D) foi mediada por Francisco Gonçalves
A palestra de Tierra teve como mediador o presidente da Func e professor do curso de Comunicação da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Francisco Gonçalves. A exposição no Espaço Wilson Marques foi acompanhada por professores universitários e militantes políticos, que vivenciaram o período de recessão que o país mergulhou durante mais de duas décadas.

Na abertura, o mediador Francisco Gonçalves apontou as manifestações contemporâneas ocorridas na semana passada na Avenida Paulista, em São Paulo, como exemplo da necessidade do resgate histórico do que foi o legado da ditadura militar. A importância de não esquecer as violações aos direitos humanos quando se completa 50 anos do golpe foi endossada por Pedro Tierra.

“A ditadura deixa o seu veneno circulando na sociedade sobre a forma do medo, da acomodação, do individualismo, durante muito tempo”, alertou o poeta. Ele destacou a importância da luta contra o golpe militar e convidou os presentes a refletirem sobre a capacidade que a cultura brasileira teve de produzir literatura, música e teatro e manter o ímpeto de açoitar a opressão e o poder ditatorial.

Durante mais de 50 minutos, Pedro Tierra lembrou pessoas que com ele se ombrearam na luta à época e relatou as dificuldades transpostas para escrever em um período tão difícil como foi no período da ditadura. “Há os que vivem a lamentar a opressão, eu morrerei denunciando-a”, declarou.

O poeta apresentou poemas do seu primeiro livro, escrito durante o período em que esteve na prisão em diferentes presídios do país: Brasília, Goiânia e São Paulo, entre 1973 e 1977. Entre março e outubro de 1973, o poeta disse ter passado o período mais terrível, quando esteve em Carandiru e na Penitenciária do Estado de São Paulo.

O livro “Poema do Povo da Noite”, cuja capa traz como ilustração uma janela da Penitenciária de São Paulo, conta o cotidiano na cela e foi reeditado três décadas após a primeira publicação por duas editoras brasileiras: da Fundação Perseu Abramo e a Published. “Minha vida não seria a mesma se esses poemas não fossem escritos”, mensurou o poeta, nascido em Porto Nacional (TO), antes do desmembramento do Estado de Goiás.

A escrita dos poemas por Tierra foi possível a partir da aquisição clandestina de uma caneta na sala de interrogatório. Os primeiros textos foram escritos em papel de cigarro. “Isso foi possível porque quem trabalha para caçar a inteligência, nem sempre é muito brilhante”, ressaltou.

Ao longo de toda a palestra, Pedro Tierra destacou o importante papel que a cultura assume na luta contra a opressão, sendo indissociável da resistência. Ele lamentou a redução deste papel pelo simples entretenimento que a linguagem teatral assumiu no país, com exceção do teatro popular e de rua que lidam com outros elementos e têm outros objetivos.

O poeta concluiu a palestra afirmando que a melhor poesia de hoje está na periferia, cantada na boca do povo nos bairros pobres. “Mano Brown fala com contundência para periferia porque ele venceu a censura do mercado. Nós temos hoje no Brasil um desafio para reconstruir a esperança”, constatou.

Memória

Ao iniciar a palestra, Pedro Tierra repudiou o achincalhamento da memória de companheiros da luta contra a ditadura. Militante político desde 1969, quando tinha apenas 21 anos de idade, Pedro Tierra foi preso aos 24. Entre os nomes que disse não poder esquecer citou Dom Paulo Evaristo Arns, salvador de muitas vidas no período escuro. Ele também citou outros nomes como Chico Mendes, Margarida Alves, Josito Tavares, Sebastião Rosa, presidente do sindicato dos trabalhadores rurais, assassinado dentro de casa.
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